Validade da notificação do devedor por e-mail: uma esperança para agilizar a apreensão de bens dados em garantia fiduciária

Validade da notificação do devedor por e-mail: uma esperança para agilizar a apreensão de bens dados em garantia fiduciária

A alienação fiduciária de bens móveis é um instrumento que proporciona bastante agilidade na recuperação de crédito, já que permite ao credor apreender e vender um bem que é dado em garantia da dívida, de forma rápida e pouco burocrática, conseguindo assim receber o que lhe é devido.

Esse processo poderia ser muito mais ágil se não fosse a resistência dos tribunais em compreender e aceitar a utilização de e-mail ou outros meios eletrônicos para o envio de correspondências e notificações.

Isto porque o Decreto-lei 911/69 exige que para o ajuizamento da ação de busca e apreensão o devedor seja notificado sobre o inadimplemento contratual e prevê que essa notificação possa ser realizada por meio de carta registrada com aviso de recebimento.

Este procedimento que parece simples, pode se tornar um obstáculo e atrasar a recuperação do crédito quando o endereço do devedor está localizado em área rural ou de difícil acesso e não atendido pelos serviços dos Correios. Nesses casos, o credor precisa recorrer aos cartórios para protestar o título, procedimento que pode ser demorado, onera o credor e pode gerar discussões sobre sua validade quando realizado por edital.

Considerando que o objetivo dessa notificação é informar o devedor sobre o inadimplemento contratual e impedir que ele seja surpreendido com a apreensão dos bens que ofereceu em garantia da dívida, o envio dessa notificação por e-mail ou outro meio eletrônico cumpriria seu objetivo de forma muito mais rápida e eficaz do que um protesto de título realizado por edital, por exemplo. Não é razoável acreditar que os devedores estarão mais bem informados se notificados em um edital de protesto do que por e-mail ou uma mensagem de whatsapp.

Apesar disso, a maioria dos tribunais ainda rejeita o uso do e-mail como forma de notificação do devedor para fins de ajuizamento de ação de busca e apreensão, normalmente com a justificativa de que não há previsão legal para a utilização desse meio, ou que não seria possível saber se o devedor leu ou não a mensagem eletrônica.

Tais argumentos se mostram bastante frágeis, já que não há determinação legal para que a notificação seja realizada exclusivamente pelos Correios. Também não há garantias de que uma notificação por carta será efetivamente lida, pois não há exigência de que seja recebida pelo próprio devedor, bastando ser entregue no endereço informado no contrato.

A realidade é que historicamente nossos tribunais resistem ao uso de novas tecnologias em substituição a procedimentos obsoletos. Por muito tempo o Superior Tribunal de Justiça inadmitia o pagamento de custas recursais por meio da internet, obrigando que as partes se dirigissem a uma agência bancária para realizar o pagamento, como se fosse o papel da impressora do banco que comprova a efetividade do pagamento. Outro exemplo claro dessa resistência é que até hoje um advogado pode protocolar uma petição por FAX, mas se essa petição for enviada por e-mail, não será aceita.

Um passo importante foi dado para quebrar essa resistência e permitir que a utilização de meios eletrônicos seja aceita, e assim possa agilizar o procedimento de notificação do devedor.

No julgamento do agravo em recurso especial nº 1516819/RJ[1], a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou a validade de uma notificação realizada por e-mail, justificando que esse meio cumpre a mesma finalidade que o envio de uma carta com aviso de recebimento, já que é possível verificar o envio para o endereço eletrônico informado pelo réu no momento da celebração do contrato, a ciência inequívoca da data do envio e do recebimento da notificação eletrônica e a identificação segura do emissor da notificação.

Infelizmente ainda não há segurança jurídica para a utilização do e-mail ou outros meios eletrônicos para a notificação dos devedores, pois esse entendimento ainda não tem sido seguido de forma ampla pelos tribunais estaduais. De qualquer forma, essa decisão gera a esperança de que, em um futuro próximo, o ajuizamento de ações de busca e apreensão se torne mais ágil com o uso da tecnologia para a notificação dos devedores.

Autoria de: Carlos Eduardo Langovski


[1] Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201901659405&dt_publicacao=07/10/2020

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